20111213

As outras histórias

Todos os dias trabalho com texto. Ficção, não-ficção, próprio, de outros, estruturando, criando, editando, por iniciativa própria ou por contrato. E, no entanto, parece-me sempre que nunca consigo criar o texto que está sempre comigo, que me perturba. Parece-me também que existem duas barreiras que contribuem para o referido efeito. A primeira é a de que não consigo encontrar as palavras que traduzam o que me acossa. A segunda, sendo eu um burocrata, é que não consigo desenhar o formato adequado. Um dos textos que me persegue desde sempre, e que se desdobra em múltiplos textos, tem a ver com as outras histórias. Acho que o projecto nasceu com as cidades invisíveis de calvino, lido há mais de duas décadas. Em essência, tem a ver com reportar e reproduzir em texto os imaginários riquissimos a que normalmente não temos acesso. Por exemplo, como será hoje viver em Detroit. Mas também como persistir na manufactura de ferramentas. Ou, ao lado, como será o mundo dos que já pertencem aos nós digitais. Por outras palavras, convocar todos os mundos que escapam um pouco ao interior das nossas fronteiras limitadas. Pensava nisto, mais uma vez, hoje de manhã. E eis que a minha amiga Cândida alerta para um maravilhoso texto de Henning Mankel, "In africa, the art of listening", publicado no New York Times. O texto fala da experiência de viver aquilo que eu idealizo. É uma espantosa coincidência. Tenho de lhe prestar atenção.

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