20091019
A irrelevância da PSP
A tese de doutoramento de Susana Durão, que já existe em livro com o título "Patrulha e Proximidade" é um dos poucos documentos sólidos que temos sobre a Polícia de Segurança Pública (PSP) contemporânea. A investigadora esteve no terreno durante um longo período de tempo, acompanhando a vida de uma esquadra de Lisboa. O trabalho dá-nos uma série fabulosa de dados sobre a ideologia, o imaginário e a praxis dos homens da PSP que nos "serve e protege", mas aqui gostaria apenas de pensar um pouco sobre como os dados empíricos obtidos nos permitem lançar várias pistas que sustentam a hipótese de que existe hoje um enorme fosso entre o que os polícias querem que seja a PSP a que pertencem e aquilo que nós queremos dela. Os polícias querem fazer investigação criminal, aquilo a que chamam "serviço operacional". Nós cidadãos queremos uma polícia que nos proteja, e que seja o agente de autoridade numa sociedade urbana cada vez mais conflituosa. Deste modo, os polícias estão orientados para o que chamam os "bons serviços", ligados à investigação sumária do tráfico de droga e aos furtos, e nós gostaríamos de ter alguém com poder atribuído para resolver o caos rodoviário, e as pequenas violações cívicas e éticas do espaço comum e público. Desta fractura profunda de objectivos, nascem alguns desencontros. Os polícias procuram investigar o que para eles é importante, nós sentimos que eles não respondem ao que nos interessa. Os polícias tendem a acreditar no nós contra eles, e ignoram por exemplo o patrulhamento a pé, a única estratégia de conhecer a comunidade que patrulham e ganhar informação. Nós gostaríamos de conhecer alguém que pudéssemos chamar, e também confiar. Existindo já uma polícia de investigação na arquitectura de segurança nacional, a Polícia Judiciária, e tendo a própria PSP uma divisão com esse objectivo, não será um risco muito grande defender que se a força da PSP no terreno não mudar a sua estratégia, o seu papel será cada vez mais irrelevante para aqueles que deve proteger.
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