20091101
identificando o outro
A presença do terrorismo jihadista na Europa provoca um desafio extremo à nossa capacidade de identificar o outro. É um teste que está já para além da nossa resistência a aceitar e a comunicar com a minoria, como tão bem teoriza Appadurai no seu livro mais recente. O problema na identificação do outro - muçulmano, árabe ou asiático, com referências éticas, culturais e sociais distantes - começa logo na aproximação. Este outro é um ser de códigos e territórios distantes ou desconhecidos. Fala outra língua, todos os seus actos estão submetidos a uma cultura estranha, percorre circuitos que nos são invisíveis, que não conseguimos experimentar, ou onde não nos deixam entrar. Na verdade, comemos "indiano" mas nunca vamos à cozinha, entramos nas lojas do eixo Martim Moniz - Castelo, mas não vamos beber chá aos quartos das pensões adjacentes, e muito menos temos acesso às mesquitas oficiais e clandestinas. Por outras palavras, a menos que participemos num acontecimento fora do normal, não temos lá muitos pontos de contacto. A partir desta aproximação deficiente, a nossa identificação - que fazemos a partir dos nossos códigos e das nossas leituras da realidade - tem todas as propriedades para ser incorrecta. O outro, muçulmano árabe ou asiático não residente na Europa, move -se em círculos clandestinos, e aprendeu a proteger - se. Quase certamente, está sempre à beira da ilegalidade, não tem residência autorizada nem contrato de trabalho, e comete mesmo crimes, como a burla com cartões de crédito ou o "casamento branco" com uma cidadã comunitária.Os padrões que outros com mais experiência estabeleceram mostram - nos que o outro, quando cumpre os requisitos acima mencionados, ou é um criminoso em circulação global na União Europeia, ou membro de uma célula terrorista que pacientemente vai entrelaçando os fios necessários a uma operação. Mas, na verdade, o outro, agente de ilegalidades e crimes, pode ser apenas um de nós. Um ser solitário em terras estranhas obrigado a executar actos que condena porque está à procura de uma vida decente para si e para os seus. Neste contexto que hoje vivemos, identificar o outro distante, o muçulmano emigrante, é uma tarefa fascinante para o investigador académico, mas sensível e grave para o investigador de segurança.
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A Europa Ocidental começou a "civilizar-se" num periodo de guerras e confrontos permanentes quer na Europa, Médio Oriente ou Asia; a época distante dos cavaleiros não pode ser contada sem o recurso ao confronto destes com os Muçulmanos. Esta é uma história mais antiga que a nossa (lusitana), que conheceu menos periodos de concórdia e mais de discórdia. Penso que qualquer análise que se faça sobre esta relação terá sempre o peso dos séculos.
ResponderEliminarNão acredito que este conflito ancestral alguma vez tenha fim; acredito sim que tem fases mais ou menos violentas onde variam os diferentes modos de abordagem dessa violência. É isso que a história nos tem mostrado.
A somar a isto temos duas realidades incompatíveis o estado laico vs. estado teocrático.
Assim, parece-me que esta relação secular anula a neutralidade da investigação que se faça, seja académica seja de segurança. A guerra tem essa capacidade de marcar a ferro e condicionar, gerações inteiras.
Att. Pedro Gama
uma análise muito interessante, eu estava apenas a analisar o período contemporaneo. cump, jv
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